|
|||||
|
|||||
As 1001 noites - Farruz e sua esposa
Conta-se que certo rei estava sentado um dia no terraço de seu palácio quando
viu, no terraço da casa oposta, uma mulher cuja beleza não tinha igual entre
as mulheres. O rei perguntou:
– A quem pertence essa casa?" Responderam-lhe:
– E tu, ó rei, beberás da fonte onde outros pousaram os lábios antes de ti? O rei escutou-a com estupefação, voltou as costas sem dizer uma palavra e fugiu daquela casa com tamanha precipitação que deixou uma de suas sandálias no chão atrás de si. Ora, Farruz deu-se conta no meio do caminho que esquecera a carta do rei sob o travesseiro, e voltou para apanhá-la. Vendo a sandália do rei, compreendeu por que tinha sido enviado a cidade tão longínqua, apanhou a carta em silêncio e saiu sem deixar a esposa perceber a sua volta. Após cumprir a missão, apresentou-se ao rei, que o recompensou com cem dinares. Farruz levou os cem dinares ao mercado dos joalheiros, comprou magníficos ornamentos que ofereceu à mulher, dizendo: – Estes são uma lembrança da viagem. Pega-os e tudo que te pertence e volta para a casa de teus pais. – Assim farei, disse a mulher sem nada perguntar ou comentar. Adornou-se com as jóias, apanhou seus pertences e foi para a casa dos pais. Quando um mês se passou sem que Farruz procurasse a mulher, o irmão desta visitou-o e disse-lhe: – Se não queres revelar o motivo de tua cólera contra tua esposa e o abandono em que a deixas, terás que te explicar diante do rei. O marido concordou, e foram juntos à presença do rei. O rei transferiu-os ao cádi que estava sentado a seu lado. O cunhado disse: – Que Alá assista o nosso senhor cádi! Eis a minha queixa: eu e minha família possuíamos um lindo jardim, protegido por altos muros, cuidado e plantado de flores aromáticas e de árvores frutíferas. Entregamo-lo a este homem. E ele, depois de colher as flores e comer as frutas, e depois de demolir os muros e abandonar o jardim aos quatro ventos, quer romper o contrato e devolver-nos o jardim no estado em que o pôs. Tal é nossa queixa, ó nosso senhor cádi. – O cádi perguntou a Farruz: – Que tens a dizer, ó jovem? Farruz respondeu: – Devolvo-lhes o jardim com vontade e sem vontade! O motivo desta restituição é que, um dia, entrei no jardim e vi nele as pegadas de um leão. Tive medo de que, um dia, ele acabe por me devorar. O rei prestava atenção sem o deixar perceber. Ao ouvir as palavras de Farruz, compreendeu-lhes o sentido e o alcance e interveio, dizendo a seu servidor: – Ó Farruz, acalma teu coração e apazigua tuas dúvidas. Pois, pela verdade e pela santidade do Islã, é o jardim mais bem defendido que encontrei em toda minha vida. Suas muralhas o protegem contra qualquer assalto. E suas flores são as mais belas que já vi. Farruz compreendeu e fez a paz com a mulher e amou-a. Nem o cádi nem as demais pessoas presentes compreenderam de que se tratava. Pela forma alegórica dada ao pensamento de cada um, o segredo ficou limitado ao rei, a Farruz e ao irmão da esposa.
De "Farruz e sua esposa" para "Biblioteca" Copyright©2008 valdiraguilera.net. All Rights Reserved |
|||||