História do racionalismo - 17
Lao-Tsé, o precursor
José Alves Martins
Semelhanças com Confúcio e com o Cristo mitológico da teologia cristã
A exemplo do que fizemos na edição passada com relação a Buda, apresentamos neste artigo
as informações biográficas referentes a Lao-Tsé. Antes de tudo façamos um breve preâmbulo
histórico para que o leitor tenha idéia da situação em que se encontrava a China na
época desse filósofo.
Um dos principais defeitos do chinês era o orgulho, comum, aliás, à maioria
dos homens. O leitor entenderá melhor o motivo desse orgulho lendo o parágrafo
a seguir.
Segundo os historiadores, o nome primitivo da China era Reino do Meio,
pois, desde remotas eras, seus habitantes professavam a crença religiosa de que o
"Senhor do Céu" os tivesse colocado no centro da Terra, por preferi-los a qualquer
outra nação. Essa era, sem dúvida, a razão principal por que se consideravam
um povo superior aos demais, o que os fazia olhar com desprezo os "diabos estrangeiros".
Como se afirma sobre outras antigas civilizações, há notícias de que os fundadores
da tradição chinesa também tinham uma idéia vaga da teoria evolucionista,
antecipando-se, de certo modo, em milhares de anos, a Charles Darwin.
O século IX antes de Cristo é um dos marcos históricos da antiguidade chinesa,
pelo alto grau de civilização alcançado àquela altura pela nação. Em seguida,
porém, sofreu a China um atraso de vários séculos, por causa de seu contato com os
hunos, atravessando então um tenebroso período de guerras civis e anarquia.
No século VI antes de Cristo, agitada época de declínio da dinastia Zhou, os
vários principados que constituíam o império se destruíam mutuamente, expondo
perigosamente as fronteiras chinesas aos ataques dos bárbaros.
Providencialmente, porém, surgiram na China nesse período alguns homens de
grande valor, com inteligência, espiritualidade e força moral para reconduzir o país
à ordem e ao bom senso. Entre esses homens, citam-se Lao-Tsé e Confúcio, os dois maiores filósofos
chineses da Antiguidade.
Natural da cidade de Lu-Yi, Li Pe-yang, mais conhecido pelo apelido de Lao-Tsé
(Velho Mestre), foi contemporâneo de Confúcio e do indiano Buda Gautama. Segundo uma cronologia
hipotética, teria nascido no final do século VII antes de Cristo, por volta do ano
604; ou no século VI a.C., talvez no ano 570, tendo falecido, provavelmente, em
490 a.C. Há quem afirme, porém, ser desconhecida a data de sua morte, embora
alguns escritores antigos lhe atribuam a idade de 160 anos.
À semelhança de Buda e Confúcio, propôs a seus discípulos e seguidores não
uma religião e sim uma filosofia de vida, sendo, assim, um dos precursores do
racionalismo histórico.
O taoísmo, tema de artigo publicado em edição anterior deste jornal, é uma
das tradições mais antigas da civilização chinesa, mas foi Lao-Tsé, no século VI
a.C., quem codificou e deu impulso decisivo a essa doutrina.
Fundou também uma escola de filosofia na cidade de Pei, e seus ensinamentos
estão reunidos no livro Tao-Te-King (Livro do Caminho e da Virtude).
Como historiógrafo e bibliotecário do príncipe de Chou, viajou para a fronteira
da Índia, onde, acredita-se, teria entrado em contato com o budismo.
Certo dia, estando ainda a serviço desse príncipe, o afamado filósofo recebeu na
corte de Chou a visita de um jovem chamado Confúcio, que, em sua busca de saber,
viera à procura do Velho Mestre, com quem manteve, dizem as crônicas antigas, longas
horas de conversa.
Generalizou-se entre os chineses, observam os estudiosos, o costume de citar
Lao-Tsé por quase tudo, atribuindo-lhe máximas, provérbios ou sentenças que,
na verdade, têm sua origem não na filosofia taoísta, mas na sabedoria popular.
No entanto, essa notoriedade, dizem eles, indica que, para os chineses, Lao-Tsé representa
o sábio por excelência.
Embora sua doutrina não previsse a criação de uma religião, os sucessores do
filósofo estabeleceram um ritual mesclado de práticas supersticiosas.
Tal qual ocorreu com Buda e Confúcio, o nascimento e a vida de Lao-Tsé
estão envoltos em mitos e lendas. Segundo essa mitologia, sua mãe o teria concebido
do raio de uma estrela. (Você deve estar lembrando agora de uma história semelhante
contada pelos Evangelhos cristãos a respeito de Jesus, nascido cinco séculos
depois do pensador chinês...).
Ainda conforme a lenda, tendo Lao-Tsé completado a redação do livro Tao-Te-King,
retirou-se para a selva, e de lá subiu aos céus, feito realizado também, segundo a
Bíblia, por Elias, profeta do Velho Testamento, que viveu três séculos antes, e pelo
Cristo mitológico da teologia cristã.
A partir do século II depois de Cristo, o taoísmo se expandiu para outras regiões
além da China, chegando ao Japão e ao Sudeste asiático, e inspirou as práticas zen
no seu país de origem e outras regiões do Oriente. Mas chegou também ao Ocidente,
onde algumas "escolas místicas" preconizam exercícios de meditação que, por meio
do vazio mental, visam a obter o conhecimento último dos princípios do Universo.
Por outro lado, certos estudiosos da atualidade vêem no filósofo chinês um precursor
da moderna psicologia aplicada.
Historicamente, Lao-Tsé foi o grande precursor de Confúcio, exatamente como
Sócrates o foi de Platão, e João Batista, de Jesus. Aos que acreditam na realidade
das reencarnações e nas afinidades espirituais, a História oferece aí um importante
e sugestivo exemplo.
(Publicado originalmente no jornal A Razão, de agosto de 2007, www.arazao.com.br)
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