História do racionalismo - 31
Mito em verso, filosofia em prosa
José Alves Martins
Anaximandro amplia a visão racionalista de Tales e afirma que número de mundos é infinito
Discípulo de Tales, que, como sabemos, foi o iniciador da filosofia, Anaximandro, 14 anos mais novo que o mestre, é o segundo filósofo grego. Constitui, portanto, outro marco importante na história do racionalismo. Vamos, por isso, focalizar alguns fatos e feitos notáveis de sua vida.
Assim como Tales, Anaximandro também era natural da hoje desaparecida cidade de Mileto, uma das colônias gregas da Jônia, região costeira da Ásia Menor (atual Turquia). Filho de Praxíades de Mileto, nasceu por volta de 610 aC, sendo incerta também a data de sua morte. De acordo com o que diz Apolodoro de Atenas em suas Crônicas, ele contava 64 anos no segundo ano da 58ª Olimpíada (547-546 a.C.), tendo morrido pouco depois dessa data, a mesma em que morreu seu mestre.
Ao contrário de Tales, que não deixou seus ensinamentos registrados em nenhum livro ou compêndio, Anaximandro expôs, sumariamente, seus conhecimentos e teorias num livro intitulado Sobre a natureza – primeira obra filosófica e primeiro texto em prosa da História. (A mitologia e a religião criaram o verso; agora a filosofia criava a prosa.) Infelizmente, essa obra histórica se perdeu, dela restando apenas citações em livros de autores antigos, como Platão e Aristóteles, e um fragmento com meia dúzia de linhas que chegou até nós.
Formando com Tales e Anaxímenes a chamada escola de Mileto, Anaximandro, além de filósofo, foi político, matemático, geômetra, geógrafo, fundador da astronomia e o primeiro a dar caráter científico e sistemático à cosmologia grega.
Conta-se que viajou por diversos países, participou ativamente da vida política de Mileto e conduziu uma expedição colonizadora a Apolônia, antigamente uma cidade da Trácia, na região do Mar Negro.
Diz-se também ter ele previsto que Esparta sofreria um terremoto, havendo então recomendado que a população fosse retirada para lugar mais seguro, fora da cidade, e assim salvaram-se muitas vidas.
Surpreende-nos que, já em seu tempo, Anaximandro defendesse o conceito de evolução das espécies, afirmando que a vida surgira no mar e que o homem teve como primeiros antepassados os peixes; estes teriam dado origem a outros animais primitivos, que por sua vez deram origem a outros, num processo evolutivo que culminou com o aparecimento do homem. Desse modo, antecipou em muitos séculos a teoria evolucionista, preconizada por Darwin e outros cientistas da Idade Moderna.
Anaximandro dedicou-se à investigação dos mais variados assuntos, chegando, como já se disse, a conclusões surpreendentes para sua época. Foi o primeiro a descobrir que a Terra é esférica e que gira em torno de seu eixo. A ele se atribui também a autoria de um mapa do mundo então conhecido, além de outros trabalhos, como a medição dos equinócios e dos solstícios, o cálculo da distância entre as estrelas e de sua magnitude, a invenção do gnômon (relógio solar) e a construção de uma esfera celeste. Provavelmente, exerceu a função de professor.
Em suas observações, concluiu, ainda, que a Lua não tem luz própria, refletindo a que recebe do Sol.
Afirmava também que o número de mundos é infinito e, ampliando a visão racionalista de Tales a respeito do Cosmo, foi o primeiro filósofo a formular o conceito de que o Universo é regido por leis comuns e naturais e não pela intervenção direta de deuses ou seres sobrenaturais.
(Publicado originalmente no jornal A Razão, de outubro de 2008, www.arazao.com.br)
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