Valdir Aguilera
 Físico e pesquisador

 

 

Parmênides: tudo é um

José Alves Martins

'Tudo que é racional é real e tudo que é real é racional' antecipa-se a 'penso, logo existo' A exemplo de outros pioneiros da filosofia grega, Parmênides, fundador da escola eleática (de Eléia), tem sido ponto de referência para cientistas e pensadores desde a Antiguidade até os nossos dias.

Ele afirma a identidade, a unidade e a eternidade do Ser, imóvel e imutável, princípio puramente metafísico e cosmológico, despojado de caráter "divino" e religioso. Parmênides acentua, assim, o tom racionalista da escola de Mileto, que, já se disse, deu início, na História, ao pensamento racional e científico.

Parmênides distingue a ciência da opinião ou costume. A ciência é produto da razão e nos conduz à verdade sobre o Ser –- substância ou princípio primordial de tudo; a opinião ou costume nos desvia dessa verdade, pois traduz a experiência confusa dos sentidos.

Apesar de Xenófanes haver antecipado as principais ideias da escola eleática, esta foi de fato fundada por Parmênides, sucedido por seu grande discípulo, Zenão.

Natural de Eléia, cidade da Magna Grécia (sul da Itália), Parmênides, supõe-se, teria vivido, aproximadamente, entre os anos 515 e 440 antes de Cristo.

Segundo o escritor Diógenes Laércio, quem despertou em Parmênides a vocação filosófica foi seu mestre Amínias, adepto do pitagorismo. Afirma-se que teria sido discípulo também de Anaxímenes, o terceiro e último membro da escola de Mileto. Em Eléia, diz Plutarco, exerceu as funções de legislador e, na escola que aí fundou, semelhante aos institutos pitagóricos, ensinava-se filosofia e dialética.

Conta-se que, lá pelo ano 450 a.C., aos 65 anos de idade, Parmênides visitou Atenas, acompanhado pelo mencionado discípulo. Na ocasião, veio a conhecer um jovem ateniense chamado Sócrates, rapaz de compleição robusta e de rude aspecto, rosto grande e redondo, olhos fundos e arregalados, nariz largo e cabeça que lembrava a de um carregador, o mesmo que um dia passaria à História como o mais célebre dos filósofos.

Um dos encontros entre os dois foi registrado por Platão, num de seus diálogos, intitulado Parmênides, no qual este defende sua teoria da unidade do Ser e troca ideias com Sócrates, que, ainda segundo Platão, aprendeu muito com o mestre de Eléia.

Chegava assim à metrópole, proveniente de uma de suas colônias, a doutrina eleática, corrente, entre outras, do racionalismo grego, iniciado na Jônia.

Essa corrente filosófica exercerá importante influência no período clássico da filosofia helênica, que culminou com Aristóteles: este foi discípulo de Platão, que foi discípulo de Sócrates, que foi discípulo de Parmênides, que Aristóteles chamará de grande.

Ao identificar o real e o racional, Parmênides antecipou-se a Hegel, filósofo alemão, que, no século XIX, defenderá a tese de que "tudo o que é racional é real, e tudo o que é real é racional".

Do mesmo modo, ao dizer que é a mesma coisa pensar e ser, antecipou-se também ao "Penso, logo existo" de Descartes, premissa sobre a qual o fundador do racionalismo moderno fundamenta sua teoria do conhecimento. Contrariamente ao que prega a teologia cristã, baseada na Bíblia, Parmênides ensinava que nunca pode ter havido o nada e, portanto, não pode ser verdade dizer que tudo – ou qualquer coisa – proveio do nada. Tudo sempre existiu, nada foi criado.

Para ele, afirmar a existência do nada é uma contradição. "Tudo não apenas deve ser sem-princípio e não-criado, mas também eterno e imperecível. Ainda pela mesma razão não pode haver lacunas na realidade, partes dela onde nada existe: a realidade deve ser contínua consigo mesma em todos os pontos; todo o espaço deve ser preenchido, um 'plenum'. O Universo constitui uma única entidade realmente imutável. Tudo é Um."

Surpreendentemente, dizem os estudiosos, essa visão científica do Universo, preconizada por Parmênides há 2.500 anos, é muito parecida com a desenvolvida por cientistas do período histórico que vai do século XVII ao século XX, entre os quais se contam Newton e Einstein.

(Publicado originalmente no jornal A Razão, de abril de 2009, www.arazao.com.br)


 

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