História do racionalismo - 103. Uma filosofia original e inovadora
J. Alves Martins
A distância geográfica e cultural entre o continente europeu e as ilhas
britânicas, diz um historiador do pensamento, deu aos filósofos ingleses
dos séculos XII ao XIV autonomia para que pudessem criar e desenvolver
“uma filosofia original e inovadora”.
Com efeito, a rejeição por parte dessa estirpe de pensadores britânicos
às ideias da filosofia dominante na Europa continental abalaria a escolástica. Relembrando
o que foi dito em artigo anterior, “escolástica” é o nome que se dá à filosofia cristã que
predominou na Baixa Idade Média (período medieval que se estendeu
do século XI ao XV) e que, também vale repetir, tinha como uma de suas
principais características o descabido propósito de conciliar o racionalismo
grego com os dogmas da fé católica.
Destaques A primeira fase dessa “filosofia original e inovadora” teve
como principais destaques quatro pensadores: Robert Grosseteste (que
viveu entre o século XII e o XIII), Roger Bacon (século XIII), Duns Scot e
Guilherme de Ockham (que viveram entre o XIII e o XIV). Seguindo o critério
da ordem cronológica, vamos nos ocupar neste artigo apenas do primeiro,
ficando Bacon, Scot e Ockham para os próximos.
Nascido na cidade inglesa de Stradbroke e morto, aos 85 anos, em
Buckden, também cidade britânica, Robert Grosseteste (1175-1253) foi
político, filósofo, cientista e, talvez até hoje, o mais ilustre comentador
de Aristóteles, bem como teólogo, bispo da Igreja Católica e primeiro estudioso
europeu a dominar o idioma grego e o hebraico.
Antes, no entanto, de tornar-se bispo, viveu, como frade, num mosteiro
da Ordem de São Francisco, instituição religiosa da mencionada
Igreja.
Celebridade Teria sido durante o tempo em que viveu sob esse regime
monástico que se tornou famoso, dentro e fora do mosteiro franciscano,
graças à sua extraordinária capacidade intelectual, tendo recebido,
igualmente por isso, o apelido de “Grosseteste” — grosse (grande) e
teste (cabeça)—, alcunha com a qual ficaria conhecido.
Aliás, seria ainda a fama do franciscano Grosseteste que haveria de
contribuir para que fosse promovido a bispo de Lincoln, outra cidade inglesa.
Além disso, seria não só um dos fundadores da Universidade de Oxford,
mas também, e principalmente, um dos dois mais importantes e celebrados
filósofos e cientistas da época — o outro seria seu maior discípulo e
caríssimo amigo, Roger Bacon (não confundir com Francis Bacon, filósofo
britânico do século XVI, ao qual também nos referimos neste artigo,
logo abaixo).
Pioneiro Dentre suas produções filosóficas e científicas, com as quais
Grosseteste garantiria seu lugar na história da filosofia e da ciência, destaque-
se aqui o fato de ter sido ele — depois de conhecer os trabalhos
sobre ciências naturais dos árabes — o pioneiro em experiências práticas na
área do conhecimento científico da natureza.
Ou seja, Grosseteste foi o criador do empirismo (conhecimento que
provém da prática experimental, isto é, captado do mundo externo pelos
sentidos).
Precedeu, assim, em cerca de três séculos, Francis Bacon, político, estadista,
ensaísta, filósofo e cientista britânico, que viveu entre o século
XVI e o XVII e que, pioneiramente, na Inglaterra e em seu tempo, praticou e
preconizou o empirismo.
No que tange às valiosas pesquisas feitas por Grosseteste em comum
com seu discípulo Roger Bacon, enfatizem-se, por exemplo, aquelas
que deram início à confecção de óculos, o que se tornaria, futuramente,
de grande valia para o desenvolvimento de importantes instrumentos
científicos, como o telescópio e o microscópio.
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