História do racionalismo - 71
José Alves Martins
A felicidade, segundo Aristóteles
(Em honra das mulheres, antes de tudo um aviso: quando o filósofo usa aqui o termo “homem”, está
referindo-se ao ser humano. Portanto, às mulheres também.)
“O homem nasce com um único fim – ser feliz”, afirma Aristóteles. Mas em que
consiste a felicidade? É o estado agradável de espírito decorrente de um viver virtuoso,
do exercício habitual de boas obras. Essencialmente, consiste nisso, sustenta ele.
Contudo, outros requisitos, “de ordem secundária”, também concorrem para completar
a felicidade do homem. Por exemplo, “ser dotado de certo número de bens” – boa origem, boa aparência, boa sorte, bons
amigos, “uma dose suficiente de harmonia” e uma vida longa e com saúde.
Mas essas condições de “segunda ordem”, que também podem concorrer para
a felicidade do ser humano têm, na verdade, mais valia para o cidadão comum. A um
homem de maior nobreza de espírito, é possível ser feliz mesmo numa vida breve
e enfrentando pobreza e outras situações adversas. Ou seja, ele “pode ser feliz renunciando
à própria felicidade”.
Nenhum indivíduo que trilha o “difícil caminho” da virtude pode ser chamado
infeliz, porque “jamais fará algo odioso ou mesquinho”, pois, de fato, reafirma o mestre,
a felicidade é consequência de um viver virtuoso.
O que é a virtude No entanto, se a felicidade é um estado de alma decorrente da
virtude, o que é então a virtude? – indaga, socraticamente, Aristóteles.
O vocábulo grego para virtude é “arete”, termo que deriva de “Ares”, que, na antiguidade
grega, era o deus da guerra. Por sua vez, nosso termo “virtude” procede da
palavra latina “virtus”, que significa “qualidade de varão”, “varonil”, “viril”. De sorte
que, para os antigos gregos e romanos, virtuoso era aquele que possuísse, principalmente
(além de competência técnica e bom QI), coragem física.
No entanto, a essas três qualidades do virtuoso antigo acrescenta Aristóteles
uma quarta – a nobreza moral, ou excelência moral, como ele também a chama. Essa
“excelência completa”, ou seja, a posse dessas quatro qualidades, é arma valiosa para
o “guerreiro feliz” de Aristóteles nas batalhas da vida.
O cavalheiro aristotélico Uma pessoa virtuosa e, portanto, feliz, diz o filósofo,
adota sempre o “meio racional” de vida, isto é, a regra áurea do meio termo. Em
outras palavras, nada faz de menos ou de mais, não sendo, pois, nem supernormal
nem subnormal, e sim “justa e sabiamente normal”. “Age nos momentos certos, em
relação aos objetos certos e às pessoas certas, com o motivo certo e da maneira
certa.”
Assim, temos aí a real descrição do cavalheiro aristotélico, o homem ideal, digno
de ser feliz. Esse homem ideal “não se expõe desnecessariamente ao perigo, mas está
preparado, por ocasião das grandes crises, para dar a própria vida, se preciso for”.
Sinal de superioridade O cavalheiro aristotélico sente prazer em fazer favores,
mas envergonha-se de recebê-los. Pois, se, por um lado, fazer obséquios é sinal de
superioridade, por outro, recebê-los é indício de inferioridade.
Para o homem ideal, uma boa ação não é um ato de autossacrifício, e sim de autopreservação,
posto que o ser humano não é uma criatura individual, mas uma criatura
social. Além do mais, qualquer boa ação “é sempre um rendoso emprego de
capital”. O bem que hoje fazemos há de ser, com certeza, retribuído, com juros, mais
cedo ou mais tarde.
O cavalheiro aristotélico, é, portanto, um espírito altruísta. Assim é, acentua Aristóteles,
porque é sábio, virtuoso e feliz. Enumerar aqui seus atributos demandaria
muito espaço e tempo. Assinalem-se, porém, alguns: não fala mal de ninguém, nem
mesmo dos inimigos, “a não ser que o faça diretamente a eles”; não guarda nunca
rancor e sempre esquece as injúrias; “em suma, é um bom amigo para os outros, porque
é o melhor amigo de si mesmo”.
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