Valdir Aguilera
 Físico e pesquisador

 

 

História do racionalismo - 95. Cícero – político, orador e filósofo

J. Alves Martins

Em 13 de janeiro do ano 106 a.C., nascia numa cidadezinha chamada Arpino, na região do Lácio, Itália, Marco Túlio Cícero, que será conhecido como filósofo, escritor, político, estadista, advogado e maior e mais célebre orador que Roma antiga conheceu.

Seu pai – Cícero, o Velho –, homem rico e culto, diz ao filho que deseja proporcionar- lhe aprimorada educação e que para isso o menino precisa ir para uma cidade grande e ruidosa chamada Roma, a fim de completar seus estudos. Agora, já na “cidade grande e ruidosa”, Cícero, então com apenas 10 anos e acolhido na casa de parentes, sente saudade do que acaba de deixar – a querida família, a pequena Arpino e “os silenciosos campos e montanhas que a envolvem”.

Em Roma, Cícero aprende literatura grega e latina, recebe aulas de oratória com um dos melhores mestres da época, e seus estudos se tornam cada vez mais intensos a partir dos seus 16 anos. Passa, então, a se aprofundar no conhecimento das obras dos filósofos e dos historiadores gregos e, com o jurista romano Múcio Cévola, passa também a conhecer as leis e as instituições públicas da República Romana. Sua eloquência o levaria a ocupar importantes cargos políticos. Em 78 a.C., é indicado para o posto de questor, na Sicília; em 69, ao regressar a Roma, é eleito edil; e em 63, cônsul, mandato que concedia ao ocupante do cargo a responsabilidade de exercer o Poder Executivo da República.

Defender suas opiniões de maneira oratória, quando tratava de filosofia, era um dos métodos por meio dos quais Aristóteles distinguia-se de Platão, de quem fôra discípulo. Quase três séculos depois, Cícero viria a imitá-lo. No entanto em seus tratados filosóficos ele haveria de unir a filosofia não só à eloquência como também à História.

Para o historiador do pensamento Denis Huisman, a importância de Cícero não se restringe ao que ele foi como político, estadista, orador, escritor e filósofo. Deve ser reconhecido também o fato de ter ele escrito uma obra que se constituiria “numa das principais fontes primárias para o estudo da Roma antiga e num legado de grande influência na cultura europeia”.

Ainda segundo o estudioso, Cícero “nunca deixou de aplicar a reflexão filosófica aos grandes problemas propostos pela História, pelas relações entre palavra e força, entre ação e contemplação, entre fins e meios”. O que, também, não deixa de provar o lugar importante que a filosofia ocupava na vida de Cícero.

Tendo se enamorado pela filosofia na juventude, Cícero voltaria à antiga namorada por volta do ano 55 ou 54 a.C., já cinquentenário. Mas, dessa feita, para abraçar “com força total” sua amada filosofia pelo resto da vida. Daí em diante ele começa a se interrogar sobre o sentido de sua vida pública e a se interessar por ela, enquanto, por sua vez, dois bicudos, Júlio César e Pompeu, ainda não em confronto, não só se interessam pela vida pública em Roma como também a dominam.

A partir do ano 46, Cícero dá especial atenção à parte de sua obra filosófica dedicada à metafísica, ou filosofia primeira, buscando assim consolo para seus malogros, suas vicissitudes e decepções, bem como para o que ele considerava, então, “a morte da liberdade”.

Segundo outro historiador, Cícero, quando não ocupava cargos públicos, aproveitava o tempo de inatividade política para se dedicar a seus escritos filosóficos e a preservar e divulgar as obras dos filósofos da Grécia. Com efeito, é a esse grande e incansável trabalhador, não só na área política e na forense, como também na da cultura, que devemos hoje o conhecimento de grande parte desses “tesouros do racionalismo grego”, que, não fôra Cícero, estariam para sempre perdidos.

De sua extensa obra não constam apenas temas de natureza filosófica. Ela contempla também os de ordem política, incluindo-se entre estes centenas de discursos. Como filósofo, escreveu: Sobre a república; Sobre as leis (em que comenta a história romana à luz da teoria política grega); Hortênsio (uma exortação à filosofia); Sobre o luto e a consolação; Sobre o ceticismo acadêmico; Discussões em Túsculo (diálogos sobre a dor, a morte e a virtude); Sobre a natureza dos deuses; Sobre a mântica (arte da adivinhação ou divinação, da profecia, do vaticínio); Sobre o destino; Sobre a amizade; Sobre a velhice; Sobre a glória; Sobre os deveres; Sobre os objetivos da ética (exposição e refutação do epicurismo e do estoicismo); e Academia (a respeito da epistemologia probabilista, isto é, sobre o conhecimento baseado na doutrina do probabilismo).

Cícero morreu em 43 a.C., aos 63 anos, executado por ordem do general Marco Antonio, um dos membros do triunvirato que então governava a República Romana e contra o qual Cícero pronunciara no Senado as famosas Filípicas – discursos cujo principal objetivo era forçar o general a renunciar.

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